UGARELLI

Bastante importante para resguardar os interesses dos sócios e da sociedade, o Acordo de Sócios (ou de Acionistas) – que neste artigo vamos chamar simplesmente de Acordo – é um instrumento bastante utilizado para assegurar a continuidade das empresas e uma relação saudável entre os sócios.

É comum, no entanto, haver uma confusão entre o Contrato Social e o Acordo de Sócios/Acionistas, que, na verdade, são instrumentos bastante distintos. Enquanto o Contrato Social é um documento público e funciona como uma espécie de “certidão de nascimento” da empresa, onde constam as informações básicas (capital social, endereço da sede, sócios, a qualificação do administrador, entre outras), o Acordo é um instrumento particular que visa regular a relação dos sócios no dia a dia da empresa.

Este Acordo nada mais faz do que estabelecer diretrizes sobre o comportamento dos sócios, funcionando como um verdadeiro “guia” para situações que poderiam levar a litígios ou incertezas no dia a dia da organização. É um documento que visa trazer muitos benefícios aos sócios – majoritários e minoritários –, pois assegura que as “regras do jogo” serão cumpridas por todos.

No entanto, surge um questionamento: Por que, então, não constar essas regras já no contrato social? Não seria mais simples? Não é bem assim.

O Acordo de Sócios é um documento delicado, e via de regra sigiloso, que estipula informações que muitas vezes podem ser consideradas confidenciais e/ou sensíveis da organização. Desta forma, se essas disposições constassem no Contrato Social, várias estratégias da companhia seriam tornadas públicas – o que prejudica o negócio –, além do fato de que tais informações poderiam cair em mãos de terceiros mal-intencionados, agravando ainda mais o cenário.

Além disso, constar disposições sensíveis no Contrato Social poderia ser impeditivo para contratação por bancos, agências e/ou órgãos públicos que exigem a cópia desse documento em determinadas situações. Logo, ao verificar que ali constam disposições que poderiam “impedir” ou “dificultar” a relação da empresa com esses terceiros, a empresa estaria numa situação de claro prejuízo – o que não é bom.

Mas o que seria importante constar num Acordo de Sócios (ou Acionistas), então?

A lista não tem limites, e tudo vai depender da natureza do negócio, da maturidade dos sócios/acionistas e das deliberações tomadas para a gestão do negócio. No entanto, podemos destacar as sete principais disposições que um Acordo de Sócios (ou Acionistas), geralmente, prevê.

  • Deliberações em Reuniões de Sócios ou Assembleias de Acionistas: aqui, os sócios/acionistas podem ajustar a forma de convocação dessas reuniões, o quórum necessário para aprovação de cada matéria, os critérios de desempate (quando ocorrer), o peso de cada voto (dependendo da quantidade de ações ou quotas de cada sócio), entre outras disposições.
  • Atribuição de cada sócio na atividade da empresa: trata-se de um ponto muito importante, onde se estipula a obrigação de cada sócio no desenvolvimento do negócio. Veja, não é raro ver sociedades em que somente um dos sócios contribui para o crescimento do negócio, sendo que o outro não cumpre com suas obrigações. Ao constar essas obrigações neste tipo de acordo, tem-se claramente as “regras do jogo” e as punições nos casos em que o sócio/acionista seja omisso.
  • Quem pode trabalhar na sociedade e as limitações: é muito comum que alguns sócios, sem qualquer expertise na área, queiram “dar seu pitaco” no dia a dia da empresa. Vamos além, muitas vezes, familiares dos sócios querem ingressar como colaboradores da sociedade, sem condições de contribuir efetivamente para a companhia. Assim, considerando esses cenários, o Acordo poderá estipular competências mínimas para que cada acionista/sócio e/ou colaborador possa prestar serviços à empresa.
  • Cláusulas de lock-up: esse tipo de cláusula estipula que os sócios devem ficar um tempo mínimo ou cumprir determinadas metas antes que possam vender/alienar suas quotas a terceiros. Na prática, essa cláusula evita que o sócio fundador saia da sociedade quando um sócio investidor realizar algum aporte na empresa. Assim, o Acordo poderá, ainda, estabelecer penalidades pela saída prematura, o que fará o sócio pensar muito bem antes de tomar essa decisão.
  • Direito de preferência: essa cláusula regulamenta as situações em que os sócios decidem alienar/vender sua parte da sociedade. Nesses casos, estabelece-se o direito de preferência dos sócios/acionistas remanescentes – evitando que terceiros alheios ao negócio ingressem na sociedade sem a anuência dos sócios/acionistas que ficam, garantindo uma proteção adequada do negócio.
  • Cláusulas de Drag Along e Tag Along: essas cláusulas visam proteger os sócios/acionistas em situações que impliquem na alienação/venda da empresa para terceiros. Em resumo, a cláusula Drag Along garante aos sócios majoritários o direito de obrigar os sócios minoritários a aceitar a proposta de terceiros para a venda da empresa, sem que haja necessidade do consentimento destes minoritários – sendo que a venda ocorrerá nas mesmas condições comerciais de venda das ações/quotas dos sócios majoritários. A cláusula Tag Along, por sua vez, protege os sócios minoritários, uma vez que confere a estes o direito de deixar a sociedade efetuando a venda de suas quotas/ações pelo mesmo preço e condições que os sócios majoritários tiveram.
  • Cláusula de não concorrência e não aliciamento: essas cláusulas são muito importantes para assegurar que os sócios que eventualmente se retirem da sociedade não possam abrir empresas concorrentes do mesmo ramo de atuação (em determinada área e/ou por determinado período) ou ainda contratem colaboradores da empresa ou pratiquem o aliciamento de clientes desta para seu proveito próprio. É muito comum que se estipulem multas/penalidades severas nestes casos.

Destacamos ainda outras cláusulas que são bastante úteis: cláusulas de confidencialidade; formas de sucessão dos sócios/acionistas; liquidação das quotas (ou seja, como serão realizados os pagamentos dos dividendos e haveres quando houver dissolução parcial ou retirada do sócio); cláusulas de solução de conflitos, entre outras.

Como foi possível observar neste breve artigo, as possibilidades de assuntos a serem tratados num Acordo de Sócios/Acionistas são infindáveis, uma vez que tudo vai depender da natureza do negócio, das decisões dos sócios e dos objetivos de cada empresa. O que podemos afirmar é que um acordo de sócios é um instrumento poderosíssimo no Direito Societário, garantindo previsibilidade, segurança e saúde à empresa durante toda a sua existência.

Atenção: este artigo tem caráter meramente informativo e não substitui a consulta a um advogado especializado no assunto.

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