UGARELLI

Você, provavelmente, já deve ter ouvido falar alguma coisa no sentido de que ter uma holding patrimonial (ou holdings familiar) é uma “excelente estratégia para blindagem patrimonial”. Se você já viu ou ouviu algo neste sentido, precisamos te alertar às vantagens e desvantagens deste tipo de estrutura.

Aqui já vai um spoiler: TER UMA ESTRUTURA DE HOLDING NÃO É PARA QUALQUER FAMÍLIA!

Apesar de as holdings terem ganhado cada vez mais destaque como uma eficiente ferramenta de gestão patrimonial e sucessória – a estruturação desses negócios requer extrema cautela, pois podem se tornar uma grande armadilha a médio e longo prazos.

ANTES DE MAIS NADA, O QUE É UMA HOLDING (FAMILIAR OU PATRIMONIAL)?

Uma holding é uma estrutura patrimonial criada, por meio da constituição de uma empresa, com o propósito específico de administrar os bens de uma família. Geralmente, os membros da família transferem esses bens para essa empresa, que passa a ser sua proprietária legal. Os membros da família, assim, tornam-se acionistas ou sócios da holding, o que lhes confere direitos sobre os lucros e o patrimônio da empresa.

A HOLDING É UM TIPO SOCIETÁRIO?

Não, o tipo societário “holding” não existe no sistema jurídico brasileiro, trata-se de uma terminologia importada do inglês que significa “segurar”, “abraçar”, “manter”. A holding, conforme informamos acima, é uma estrutura, uma estratégia, uma forma de planejamento, que visa “facilitar” a administração dos bens de uma família, de modo a reduzir custos/tributos e facilitar o planejamento sucessório.

VANTAGENS E RISCOS DE SE CONSTITUIR UMA HOLDING

UMA CAMADA A MAIS DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO: Uma das principais vantagens “mais vendidas” sobre as holdings familiares é a chamada “proteção do patrimônio”. Ao transferir os bens para a empresa, eles se tornam parte do patrimônio da holding, que fica separada dos bens pessoais dos membros da família. Isso pode, em tese, minimizar riscos e proteger os ativos contra credores, litígios e outros riscos.

Entretanto, temos que a holding somente cria mais uma camada a mais de proteção e não blindagem patrimonial. Veja, ao transferir os bens para empresa (geralmente ocorrida na forma de integralização – que não gera tributação), o proprietário originário passa a ser sócio da empresa e seu nome continua aparecendo como titular “indireto” daquele(s) bens.

Mas os riscos são bem altos também se feita sem qualquer planejamento. Vamos entender um destes riscos por meio de um exemplo:

Vamos supor que uma determinada família – convencida de que terá vários benefícios fiscais e economia de tributos – decide transferir seu único bem (o chamado “bem de família”) para a holding e, em determinado momento, é acionada por algum credor. O credor irá buscar todas as formas possíveis de percepção de seu crédito, dentre elas, a chamada “desconsideração da personalidade jurídica inversa” que é a tentativa de atingir o patrimônio da empresa em decorrência de uma dívida dos sócios.

Uma vez que esse bem tenha sido transferido para a holding, perde-se a chamada “impenhorabilidade do bem de família”, podendo ser atingido em decorrência da dívida, o que poderá levar a família a perdê-lo. Neste caso fictício, se a família tivesse o mantido bem na titularidade da pessoa física, haveria sim uma efetiva proteção deste bem pela lei e sua perda seria evitada.

Percebeu a gravidade de constituir uma holding sem planejamento? Este foi somente um exemplo e é por isso (e por tantos outros motivos) que uma análise detalhada de caso a caso deve ser feita cuidadosamente pelo profissional que está constituindo a holding.

PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO: Outro benefício bastante difundido sobre as holdings diz respeito à facilitação do processo de sucessão empresarial, permitindo que os membros da família transfiram suas participações na empresa de forma gradual e organizada. Isso pode ajudar a evitar conflitos entre os herdeiros e garantir a continuidade dos negócios.

Entretanto é preciso ter muito cuidado na forma de estruturação destas companhias, especialmente na eventualidade de divórcios e/ou falecimentos que vierem a ocorrer no meio do caminho. Ao estruturar esse tipo de companhia, o contrato social da holding e, mais importante, o acordo de sócios/acionistas, deverá estipular todas as regras de sucessão e as formas de lidar com essas situações extraordinárias.

EFICIÊNCIA/ECONOMIA TRIBUTÁRIA: Do ponto de vista fiscal, as holdings familiares podem oferecer vantagens fiscais significativas. Por exemplo, em alguns casos, os lucros distribuídos pela holding aos acionistas não são tributados gerando uma economia muito menor do que se os rendimentos dos alugueres dos imóveis tivessem sido percebidos pela pessoa física – o que seria tributado como renda.

Outra pergunta que sempre surge é: preciso ter um patrimônio alto para poder constituir uma holding? A resposta é, simples: não. Independentemente do patrimônio, a família pode optar por constituir uma holding, mas conforme já adiantamos no início, essa planejamento não é adequado para qualquer família.

É preciso ter em mente que uma holding não deixa de ser uma empresa como outra qualquer, a qual tem que cumprir com todas as obrigações fiscais e legais – que gera custos. Assim, é preciso avaliar todos as despesas de sua manutenção tais como, contador e tributos devidos. Além disso, as holdings não são passíveis de enquadramento no SIMPLES Nacional, mas somente pela tributação do lucro presumido ou lucro real – portanto, as obrigações tributárias demandarão um custo razoável, além do trabalho extra do contabilista na gestão tributária desta companhia.

GESTÃO PROFISSIONALIZADA: Outra vantagem de centralizar a administração dos bens familiares em uma empresa separada, é a facilitação de contratação de profissionais para administrar os ativos da família. Isso pode trazer maior eficiência e expertise para a gestão do patrimônio.

Contudo, é preciso ter em mente as obrigações trabalhistas decorrentes destas contratações e assegurar o efetivo cumprimento de todas elas. Caso essas obrigações sejam descumpridas, um passivo trabalhista, fiscal e/ou judicial poderá ser gerado, o que, por consequência, poderá atingir dos bens alocados na holding. Portanto, é preciso ter uma consultoria jurídica sólida para assegurar o compliance com as leis trabalhistas.

OUTROS PONTOS DE ATENÇÃO

Para a estruturação de qualquer holding é fundamental contar com o auxílio de advogados especializados em direito empresarial e tributário para garantir que a estrutura seja criada e operada de acordo com a legislação vigente e os interesses da família. Com essa consultoria, o consultor jurídico irá avaliar cuidadosamente toda a estrutura e entender todo histórico da família, entender os objetivos da família, a natureza e os bens a serem alocados, elaborar os documentos societários adequados e orientar a família das obrigações decorrentes da instituição desta empresa.

Além disso, é muito importante considerar que as holdings não são adequadas para todas as famílias e situações. Antes de decidir criar uma holding familiar, conforme já adiantamos no parágrafo anterior, é primordial realizar uma análise detalhada levando em conta aspectos legais, tributários, financeiros e familiares.

CONCLUSÃO E ALTERNATIVAS

Num breve resumo, as holdings podem ser consideradas uma relevante ferramenta para a gestão patrimonial e sucessória de famílias que desejam aumentar a proteção patrimonial e organizar seus bens de forma mais eficiente.

No entanto, é imprescindível que essa estruturação seja feita com o aconselhamento de profissionais qualificados de modo a assegurar que a estrutura seja criada e gerida de acordo com os objetivos da família, as melhores práticas e dentro dos limites da lei – levando-se em conta, principalmente, todos os riscos desse tipo de estrutura, em especial em decorrência de situações extraordinárias, como divórcios e/ou falecimentos.  Assim, a constituição de uma holding pode garantir a preservação/perpetuação e o crescimento do patrimônio da família, mas podem também ser uma grande armadilha se não forem criadas da forma adequada e levando-se em conta as especificidades dos beneficiários.

Mas há alternativas para uma proteção mais adequada o patrimônio, além das holdings? Em que pese serem pouco difundidas, algumas alternativas podem ser consideradas para uma boa proteção e gestão patrimonial, como por exemplo a instituição de Trusts ou de companhias offshore. Mas isso, iremos tratar em outro artigo.

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